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“Perdemos tudo” O drama dos atingidos pelas mudanças climáticas

Por Mauricio Santos Matos - ativista ecossocialista, Revolução Socialista/PSOL


Ayla, de quatro anos, moradora de Petrópolis, estado do Rio de Janeiro, foi salva após permanecer soterrada por 15 horas, retirada de baixo dos escombros de sua casa. O corpo de seu pai, Douglas, de 24 anos, protegeu-a e permitiu aos bombeiros resgatá-la com vida. Além do pai, Ayla perdeu a mãe, Beatriz, o irmão Lucas, de nove anos, e sua avó materna, Maria Lucia, todos mortos com o desabamento da casa de três andares onde viviam. Bombeiros e moradores foram às lágrimas após o resgate da pequena Ayla.


O temporal que atingiu os estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo deixou até o momento 25 mortos e um rastro de destruição. Somente em Petrópolis, a Defesa Civil informou ter havido 238 deslizamentos de terra entre sexta-feira e sábado. Um deles enterrou a família de Ayla.


Em cidades do sul do Espírito Santo a chuva intensa fez transbordar os rios, arrastando casas, carros e até um caminhão do Corpo de Bombeiros, que era usado no resgate dos moradores. As pessoas subiram para o segundo andar ou até para o telhado das casas, para se salvarem. A Defesa Civil do estado informou que choveu o dobro daquilo que havia sido previsto pelos alertas de temporal. Moradora de Mimoso do Sul-ES, Adriana resumiu a situação: “perdemos tudo, absolutamente tudo”. Na cidade já houve o registro de quinze mortes e há mais de mil e duzentas pessoas desabrigadas em municípios vizinhos.


Alerta: eventos extremos se tornam frequentes

Dias antes das inundações e deslizamentos o Instituto Nacional de Meteorologia – INMET já alertava para o grande perigo de chuvas intensas no final de semana, podendo o acumulado ultrapassar os 300 mm, chegando a catastróficos 600 mm de chuva na região serrana. Em Petrópolis-RJ já havia chovido 340 mm até o domingo pela manhã.


A tragédia foi bem menos fatal do que o ocorrido em 2022, quando houve 241 mortes em Petrópolis e cerca de 4 mil desabrigados. Mas confirma aquilo que os ecossocialistas já denunciam a mais de dez, vinte anos: a queima cada vez maior de combustíveis fósseis tem levado o planeta a esquentar como nunca visto há milhares de anos, e as consequências serão catastróficas para a vida, podendo levar à extinção várias espécies de plantas e animais.


Sem a redução gradativa e a substituição completa dos combustíveis à base de petróleo, carvão mineral e gás natural, afirmávamos que o mundo iria assistir, no futuro, ao derretimento das calotas polares, ao aquecimento anormal dos oceanos, ao branqueamento dos corais, ao colapso da agricultura, etc. Eventos climáticos extremos se tornariam cada vez mais fortes e mais frequentes, atingindo de forma desigual a sociedade humana, onde as principais vítimas seriam as parcelas mais pobres e vulneráveis da classe trabalhadora. Já é perceptível que esse “futuro” é hoje!


Rio 60 graus: a terceira onda de calor extremo em 2024

Dias antes das chuvas intensas o país passou pela terceira onda de calor no ano (em 2023 foram nove), que se estendeu de 11 a 20/03, deslocando-se do oeste de Mato Grosso do Sul e estados da Região Sul em direção ao Sudeste, com temperaturas em torno de 5°C acima da média.


Com temperaturas máximas oscilando entre 37 a 40°C, Guaratiba, na zona oeste do Rio, registrou um novo recorde na sensação térmica: 60,1°C, às 10h20.


De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE tem aumentado de forma preocupante o número de dias do ano sob o efeito de ondas de calor. Até a década de 1980 eram sete dias, em média. Nas duas décadas seguintes subiu para 20 e 40 dias/ano. Entre 2011 e 2020 foram 52 dias passados em escaldantes ondas de calor.


Lula e Petrobras: cúmplices da tragédia climática

Na contramão de apresentar soluções que diminuam os impactos dos combustíveis fósseis no aquecimento global e nas mudanças climáticas, o governo de frente ampla Lula/Alckmin continua fazendo pressão para ampliar a abertura de poços e a extração de petróleo, agora em uma nova fronteira: as bacias marítimas da Margem Equatorial.


Abandonados pelas multinacionais petrolíferas BP (britânica) e TOTAL (francesa) devido ao alto custo para atenderem a legislação ambiental brasileira, as pesquisas em alguns blocos de exploração nas bacias Foz do Amazonas e Pará/Maranhão foram assumidos pela PETROBRAS. Desde então a pressão dos acionistas da empresa, na busca por mais lucros em suas gordas contas bancárias, junto com os governadores e parlamentares do Amapá e do Pará, têm organizado um lobby poderoso onde a criação de dezenas de milhares de empregos e a (eterna) promessa de desenvolvimento para a região são o carro-chefe de seus discursos falaciosos.


Nós, povos e populações da Amazônia, já ouvimos essa narrativa mentirosa na construção da Rodovia Transamazônica e da hidrelétrica de Tucuruí, no projeto Grande Carajás, na abertura da nova fronteira agropecuária e em tantos outros “grandes projetos” impostos durante a ditadura militar e que tiveram continuidade com os governos de Lula e Dilma, como as barragens de Jirau, Santo Antônio e Belo Monte. Os empregos temporários vêm e vão; o desenvolvimento nunca chega; a riqueza fica acumulada em poucas mãos; mas sobra exploração sexual, danos ambientais, violação de direitos, assassinatos e muita pobreza para a população local.


A mais recente enganação foram os decretos de criação das Reservas Extrativistas (RESEX) “Filhos do Mangue” e “Viriandeua”, no Pará. Nos decretos Lula excluiu “uma faixa de dez metros de largura (...) para passagem de infraestrutura de escoamento de hidrocarburetos”. Também estabeleceu “liberdade de navegação e fundeio de embarcações” nas áreas marítimas das Resex, além de permitir “atividades minerárias (...) na zona de amortecimento” (entorno) das Resex. E para deixar claro que o estado brasileiro irá salvaguardar os lucros das empresas petrolíferas e mineradoras que se instalarem na região, o decreto também assegura “exercícios programados pelas Forças Armadas para a manutenção da prontidão dos meios operativos”.


Em outras palavras: os mesmos decretos que legalizam uma antiga luta das comunidades extrativistas do litoral paraense, são os mesmos que dão proteção a atividades que podem causar danos ambientais irreversíveis e a destruição dos manguezais que deveriam estar protegidos com a criação das RESEX.


“Basta de blá, blá, blá”

Em setembro/2021, durante evento preparatório para a Cúpula do Clima da ONU (COP), a ativista sueca Greta Tumberg afirmou: “Blá, blá, blá. Isto é tudo o que ouvimos dos nossos chamados líderes: palavras! Palavras que soam ótimas, mas que até agora não levaram a ação nenhuma. Nossos sonhos e esperanças se afogam nas palavras e promessas vazias deles”.


Dois meses depois, em Glasgow, Escócia, falando em frente ao prédio onde se reuniam os representantes dos países membros da COP-26, Greta novamente criticou a falta de compromisso com ações que reduzam a emissão de gases que causam danos na atmosfera e provocam as mudanças climáticas. “A mudança não virá lá de dentro. Dizemos: ‘basta de blá, blá, blá’. Basta de explorar as pessoas, a Natureza e o planeta. Basta de exploração. Basta de bla, bla, bla. Basta de qualquer coisa que estejam fazendo ali dentro”.


E completou: "Esta COP26 é, até agora, igual às COP anteriores, que não nos levaram a nenhum resultado. (...) Nas COP somente há políticos e pessoas com poder que fingem levar nosso futuro a sério”.


Isso é o que devemos dizer a Lula, aos acionistas da PETROBRAS, às multinacionais petrolíferas, aos governos burgueses e aos capitalistas bilionários: Basta de blá, blá blá! Basta de enganar os trabalhadores, os povos originários, as populações tradicionais. É preciso por fim à “Era dos combustíveis fósseis”.


Tomemos para nós as bandeiras dos jovens ativistas pelo clima:

  • Fim do financiamento fóssil, desinvestindo em projetos novos e atuais de combustíveis fósseis;

  • Eliminação progressiva rápida, justa e equitativa de todos os combustíveis fósseis, garantindo que os encargos e benefícios sejam redistribuídos de forma justa entre as diferentes partes interessadas, com especial atenção às comunidades historicamente marginalizadas e vulneráveis;

  • Investimentos maciços em projetos de energia renovável de propriedade comunitária;

  • Reparações pelos danos causados ​​às comunidades afetadas pela crise climática e suas causas estruturais, e que os países poluidores históricos paguem pelos danos ao planeta.


Para que nunca mais, crianças como a pequena Ayla, tenham que sofrer com a perda de sua família, soterrada pela ganância de lucro dos capitalistas.






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