Por: Carlos Lopes, Revolução Socialista - Rio Grande do Norte

Findo o governo Bolsonaro e a partir do início do governo Lula 3, novas frentes de luta se abrem ao povo brasileiro. Especialmente no campo, a mudança de governo abre novas possibilidades de pressões e reivindicações na luta pela terra, por desapropriações de terras improdutivas, de latifúndios e contra o agronegócio. Uma contradição, entretanto, é clara: a quem Lula governará? Atenderá aos movimentos sociais e o MST, ou buscará contemplar os empresários do agro?
No chamado “abril vermelho”, com ações dos sem-terra na Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária, o MST prepara e avança em novas ocupações de terra pelo país, incluindo uma área da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), além de sedes do Incra em ao menos sete unidades da federação.
A luta é óbvia: mais terra para quem precisa, para o povo pobre e para a agricultura familiar e sustentável; menos terra para o agronegócio que, segundo o próprio MST em seu site, “domina a lista suja do trabalho escravo e não produz alimentos para a mesa do povo brasileiro.”
Segundo mostrou a Folha de S. Paulo, as manifestações de luta por terra têm irritado Lula, temeroso de que as ações desgastem a relação do Planalto com o agronegócio. Na última sexta-feira (21), o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, se disse contrário à luta e chamou-as de “invasão”, aderindo ao termo usado por latifundiários, reacionários e pelo mercado.
"Eu já disse, discordo de qualquer tipo de invasão de áreas produtivas, sobretudo áreas que estão se desenvolvendo pesquisa, como forma de luta", afirmou Padilha. O MST defende que estas áreas, como a do Embrapa, são improdutivas.
Não cabe, como quer a cúpula do PT, a um movimento sem-terra ser base de apoio a um governo, especialmente um de coalização.
Como se vê, há uma clara contradição: como governo de colaboração de classes, Lula-Alckmin-PT tentam a todo custo fazer uma gestão de “ganha-ganha”, que tenta beneficiar a classe trabalhadora, ao mesmo tempo em que promove incentivos ao empresariado. As formas de luta espontânea são desencorajadas, ao passo em que a relação de boa vizinhança entre movimentos sociais e governo é estimulada a fim de debelar movimentos independentes e antilatifundiários.
No “esticar de cordas”, os governos de frente ampla nada têm a oferecer a não ser a “confiança institucional” e a cooptação que mesmo ante a linha de tentar beneficiar nossa classe e a burguesia, se vê com o propósito final de agradar o 1% mais rico.
Como mostra a pesquisadora Daviane Aparecida de Azevedo, a tática do “diálogo” entre governo e MST se mostrou como uma forma de “apaziguamento” das lutas.
“Apesar do diálogo existente, o governo Lula não priorizou ações significativas como a democratização da propriedade da terra, e muitas famílias em ocupações acabavam por abandonar a luta, uma vez que não acreditavam mais nas propostas governamentais em relação à política de assentamentos, visto que o próprio número de assentamentos também decaiu no segundo governo petista”, aponta Azevedo.
Não é de se estranhar que, mesmo carregando um DNA progressista em um partido surgido das lutas operárias dos anos 1980, o PT tenha diminuído consideravelmente ao longo dos anos o número de famílias assentadas, como mostra o gráfico abaixo. No primeiro mandato de Dilma, o registro de assentamentos foi menor até mesmo do que nos governos Fernando Henrique Cardoso, tucano histórico e notadamente conhecido por um processo de privatizações e de esfacelamento do Estado brasileiro.

O governo Lula, ao aceitar compor novamente com a chamada “direita moderada”, dessa vez representada por Geraldo Alckmin, mostra-se a que veio. Em uma conjuntura mundial ainda acirrada por crises e rebeliões, num momento em que um ministro (Gonçalves Dias, do Gabinete de Segurança Institucional) é demitido com menos de quatro meses, Lula busca remediar os acordos com o MST ao passo em que se mantém aliado dos ruralistas, tal como Carlos Fávaro, agropecuarista e ministro da Agricultura. O recado é: “não façamos luta de classes!”.
Como ainda mostra a Folha, o presidente carrega um histórico de dívidas com o MST, movimento que o apoiou de primeira hora em todas as suas eleições e que foi linha de frente contra a ação reacionária do Judiciário nacional e do ex-ministro Sérgio Moro de prendê-lo em 2018.
“O presidente carrega um histórico de promessas de que faria a reforma agrária na marra e na ‘canetada’. Nunca fez. Em seus dois mandatos anteriores fez um programa simplista de desapropriar terras a esmo, criando assentamentos sem infraestrutura e longe das bases acampadas do MST. Lula, por exemplo, nunca cumpriu a promessa de atualizar os índices agropecuários usados para medir a produtividade de fazendas passíveis de desapropriação para a reforma agrária”, comenta a Folha.
Neste “abril vermelho” e nos 27 anos do massacre de Eldorado dos Carajás, a luta permanece por comida no prato, terra para a plantar, contra a fome e a escravidão. As reivindicações sociais não podem ser condenadas a pretexto de beneficiar o empresariado, a imprensa burguesa e o capitalismo ecocida que destrói florestas, mata a fauna e flora e dizima indígenas e ribeirinhos. Por pão, paz e terra, reforma agrária popular!
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